segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

ATITUDE SUSPEITA

Sempre me intriga a notícia de que alguém foi preso “em atitude suspeita”. É uma frase cheia de significados. Existiriam atitudes inocentes e atitudes duvidosas diante da vida e das coisas e qualquer um de nós estaria sujeito a, distraidamente, assumir uma atitude que dá cadeia!

— Delegado, prendemos este cidadão em atitude suspeita.

— Suspeita.

— Compreendo. Bom trabalho, rapazes. E o que é que ele alega?

— Diz que não estava fazendo nada e protestou contra a prisão.

— Hmm. Suspeitíssimo. Se fosse inocente não teria medo de vir dar explicações.

— Mas eu não tenho o que explicar! Sou inocente!

— É o que todos dizem, meu caro. A sua situação é preta. Temos ordem de limpara cidade de pessoas em atitudes suspeitas.

— Mas eu não só estava esperando o ônibus!

— Ele fingia que estava esperando um ônibus, delegado. Foi o que despertou a nossa suspeita.

— Ah! Aposto que não havia nem uma parada de ônibus por perto. Como é que ele explicou isso?

— Havia uma parada sim, delegado. O que confirmou a nossa suspeita. Ele obviamente escolheu uma parada de ônibus para fingir que espera o ônibus sem despertar suspeita.

— E o cara-de-pau ainda se declara inocente! Quer dizer que passava ônibus, passava ônibus e ele ali fingindo que o próximo é que era o dele? A gente vê cada uma…

— Não senhor, delegado. No primeiro ônibus que apareceu ela ia subir, mas nós agarramos ele primeiro.

— Era o meu ônibus, o ônibus que eu pego todos os dias para ir pra casa! Sou inocente!

— É a segunda vez que o senhor se declara inocente, o que é muito suspeito. Se é mesmo inocente, por que insistir tanto que é?

— E se eu me declarar culpado, o senhor vai me considerar inocente?

—Claro que não. Nenhum inocente se declara culpado, mas todo culpado se declara inocente. Se o senhor é tão inocente assim, por que estava tentando fugir?

— Fugir, como?

— Fugir no ônibus. Quando foi preso.

— Mas eu não tentava fugir. Era o meu ônibus, o que eu tomo sempre!

— Ora, meu amigo. O senhor pensa que alguém aqui é criança? O senhor estava fingindo que esperava um ônibus, em atitude suspeita, quando suspeitou destes dois agentes da lei ao seu lado. Tentou fugir e…

— Foi isso mesmo. Isso mesmo! Tentei fugir deles.

— Ah, uma confissão!

— Porque eles estavam em atitude suspeita, como o delegado acaba de dizer.

— O quê? Pense bem no que o senhor está dizendo. O senhor acusa estes dois agentes da lei de estarem em atitude suspeita?

— Acuso. Estavam fingindo que esperavam um ônibus e na verdade estavam me vigiando. Suspeitei da atitude deles e tentei fugir!

— Delegado…

— Calem-se! A conversa agora é outra. Como é que vocês querem que o público nos respeite se nós também andamos por aí em atitude suspeita? Temos que dar o exemplo. O cidadão pode ir embora. Está solto. Quanto a vocês…

— Delegado, com todo o respeito, achamos que esta atitude, mandando soltar um suspeito que confessou estar em atitude suspeita é um pouco…

— Um pouco? Um pouco?

— Suspeita.

(Luis Fernando Verissimo)

Interpretação do texto: ATITUDE SUSPEITA

Luis Fernando Verissimo

Qual é a “frase cheia de significados” de que nos fala cronista?

Podemos dividir o texto “Atitude suspeita” em duas partes distintas: o primeiro parágrafo e o restante do texto.

Em que pessoa do discurso está escrito o primeiro parágrafo? Retire do texto uma palavra que comprove sua resposta.

Qual a principal característica do restante do texto?

No primeiro parágrafo do texto, o cronista nos explica o que é uma atitude suspeita. Retire do texto a passagem em que isso é feito.

“Delegado, prendemos este cidadão em atitude suspeita.”

Quem está falando? Como você sabe?

Onde devem estar as pessoas que participam desse diálogo?

Quantas pessoas participam desse diálogo?

Qual era a atitude do cidadão quando foi preso?

“— Compreendo. Bom trabalho, rapazes.” O que você acha que o delegado compreendeu? As explicações dadas foram esclarecedoras?

Por que o delegado considera “suspeitíssima” a alegação do acusado?

“A sua situação é preta.”

Qual o significado da palavra preta na frase acima?

Se a situação do cidadão fosse outra, oposta, que cor seria usada para caracterizá-la?

“Nenhum inocente se declara culpado, mas todo culpado se declara inocente.” Diante de uma frase dessas, qual seria o seu procedimento? Há alguma saída?

Qual a confissão feita pelo suspeito?

Por que o suspeito considerou a atitude dos “rapazes” do delegado suspeita?

Qual a atitude do delegado, ao ouvir que seus “rapazes” haviam adotado uma atitude suspeita?

Por que o delegado resolveu soltar o suspeito?

Por que a atitude final do delegado foi considerada suspeita?

Como você percebeu, os quatro personagens acabam sendo acusados de praticarem “atitudes suspeitas”, numa sequência interessante: o cidadão comum, os dois agentes da lei, o delegado!

Que conclusão podemos tirar desse fato?

16 – Todo o texto é construído a partir da expressão atitude suspeita. Por que essa expressão causa tanto problema? O que é, afinal, uma atitude suspeita?

VOCAÇÕES

Todos diziam que a Leninha, quando crescesse, ia ser médica. Passava horas brincando de médico com as bonecas. Só que, ao contrário de outras crianças, quando largou as bonecas não perdeu a mania. A primeira vez que tocou no rosto do namorado foi para ver se estava com febre. Só na segunda é que foi carinho. Ia porque ia ser médica. Só tinha uma coisa. Não podia ver sangue.

— Mas, Leninha, como é que…

— Deixa que eu me arranjo.

Não é que ela tivesse nojo de sangue. Desmaiava. Não podia ver carne malpassada. Ou ketchup. Um arranhãozinho era o bastante para derrubá-la. Se o arranhão fosse em outra pessoa ela corria para socorrê-la — era o instinto medico —, mas botava o curativo com o rosto virado.

— Acertei? Acertei?

— Acertou o joelho. Só que é na outra perna!

Mas fez o vestibular para a medicina, passou e preparou-se para começar o curso.

— E as aulas de anatomia, Leninha? Os cadáveres?

— Deixa que eu me arranjo.

Fez um trato com a Olga, colega desde o secundário. Quando abrissem um cadáver, fecharia os olhos. A Olga descreveria tudo para ela.

— Agora estão tirando o fígado. Tem uma cor meio…

— Por favor. Sem detalhes.

Conseguiu fazer todo o curso de medicina sem ver uma gota de sangue. Houve momentos em que precisou explicar os olhos fechados.

— É concentração, professor.

Mas se formou. Hoje é médica, de sucesso. Não na cirurgia, claro. Se bem que chegou a pensar em convidar a Olga para fazerem uma dupla cirúrgica, ela operando com o rosto virado e a Olga dando as coordenadas.

— Mais para a esquerda… Aí. Agora corta!

Está feliz. Inclusive se casou, pois encontrou uma alma gêmea. Foi num aeroporto. No bar onde foi tomar um cafezinho enquanto esperava a chamada para o embarque puxou conversa com um homem que parecia muito nervoso.

— Algum problema? — perguntou, pronta para medicá-lo.

— Não — tentou sorrir o homem. — É o avião…

— Você tem medo de voar?

— Pavor. Sempre tive.

— Então por que voa?

— Na minha profissão, é preciso.

— Qual é a sua profissão?

— Piloto.

Casaram-se uma semana depois.

(Luis Fernando Verissimo)

Interpretação do texto:

1 – Como é apresentada a vocação de leninha?

2 – Como a vocação de Leninha se manifestava em seu namoro?

3 – Retire do texto a passagem que anuncia um problema na carreira de Leninha.

4 – 0 obstáculo para a carreira de medicina era significativo? O que pensava Leninha?

5 – Qual a solução encontrada por Leninha para as aulas de anatomia?

6 – Como Leninha explicava os olhos fechados?

7 – Qual o desfecho da carreira de Leninha?

8 – Como o texto apresenta o marido de Leninha?

9 – Por que podemos dizer que leninha e seu marido “foram feitos um para o outro”?

10 – O texto de Luís Fernado Verissimo tem muito humor, que provem, principalmente, de frases curtas que introduzem idéias fortes repentinamente. Retire do texto umas dessas frases.

 

Bom trabalho, Galera!!!!!!

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário