Relatos pessoais
Texto 01
De como não fui ladrão
Essa
é interessante. Acho que o destino não me quis como um meliante. Sim,
digo o destino porque foi pura sorte (ou azar) eu ter sido pego em
flagrante naquela tediosa e nublada manhã de segunda-feira. Vamos direto
aos fatos. Eu era uma jovem criança de 4 anos. Morava com meus pais e
meus dois irmãos. Nunca fui uma criança problema, pelo contrário, sempre
fui muito quieto e comportado, afinal minha mãe sempre jogou duro
e meu pai... Com esse não tinha nem brincadeira. Um pequeno deslize e
ele lançava um daqueles olhares que era pior que uma surra. Meu irmão já
era o oposto de mim, muito brincalhão e peralta. O fato é que nesse dia
encontrava-me solitário, sem ninguém para brincar. Meu irmão, como já
encontrava-se na idade, estava na escola. Foi então que minha mãe me
chamou para irmos à casa de uma ex-vizinha e amiga de nossa família:
Dona Amália. Essa Dona Amália tinha dois filhos, o Cléber e a Sara.
Convivíamos muito bem juntos. Brincávamos, brincávamos e brincávamos, e
quando nos sobrava tempo, nas horas vagas, brincávamos um pouco mais
para não perder o costume. Depois de algumas quadras lá chegamos. Para
aumentar o meu tédio, ao chegarmos á casa da Dona Amália, percebi que
seus filhos não se encontravam. Também haviam ido para aquela tal escola
que meu irmão estudava. Puxa! Aquilo era realmente muito chato, duas
senhoras conversando sobre seus interessantíssimos cotidianos de donas
de casa, e eu lá, que nem uma besta sem ter o que fazer, sem ninguém
para brincar. Percebendo a falta de atenção das duas mulheres para
comigo, comecei a bisbilhotar pela casa. E eis que fulgurante e
reluzente um tesouro vislumbrava-se diante dos meus pequeninos e
cobiçosos olhos: um brinquedo. Na verdade eu era uma criança pobre,
nunca tive muitos brinquedos, pra ser sincero eram bem poucos os que
tinha. Finalmente minha cinzenta manhã colorira-se com um pouco de
alegria. Então comecei a brincar com aquele pequenino brinquedo: um
boneco do Pinóquio vermelho. Passados alguns minutos de diversão e
distração, ouvi a voz de minha mãe a me chamar. “Guto, meu filho, vamos
embora que é tarde”. Que droga, logo agora que começava a me divertir.
Então diante daquela situação, no mínimo injusta - deveria existir uma
lei que proibisse um adulto de interromper a diversão de uma criança-
não hesitei... Pelo que lembre na verdade nem pensei no que estava
fazendo. Enfiei o boneco no bolso para que em casa pudesse dar
seguimento à minha empreitada de diversão. Roubo!
Na verdade nem sabia ao certo o que era isso. Tudo ia muito bem.
Deixamos a casa de Dona Amália sem que de nada desconfiassem as duas
mulheres. Porém, como todo réu primário, acabei por entregar-me por não
conter-me em mim com o sucesso de minha empresa. No meio do caminho
retirei o boneco do bolso e comecei a brincar. Ao perceber aquele objeto
em minhas mãos minha mãe me indagou: “O que é isso, Guto?”. Em silêncio
fiquei. Em silêncio permaneci. “Guto, o que é isso?”. Agora ela colocou
o vocativo no início da frase! “De quem é isso? Diga!”. É... Quando não
tem mais vocativo na sentença da mamãe é porque fudeu tudo. Além de me
fazer devolver o brinquedo e pedir desculpas à Dona Amália levei uma
tremenda surra ao chegar em casa. A
partir desse dia aprendi que roubar é feio, mas, pior, é roubar e não
conseguir levar. Desse dia em diante me aposentei da vida do crime e
resolvi seguir uma vida normal como a de qualquer criança da minha
idade.
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