O GATO MALHADO
O GATO MALHADO
Quando a primavera chegou, vestida de luz, de cores e de alegria, olorosa de perfumes sutis, desabrochando as flores e vestindo as árvores de roupagens verdes, o Gato Malhado estirou os braços e abriu os olhos pardos, olhos feios e maus. Feios e maus, na opinião geral. Aliás, diziam que não apenas os olhos do Gato Malhado refletiam maldade, e sim, todo o corpanzil forte e ágil, de riscas amarelas e negras. Tratava-se de um gato de meia-idade, já distante de primeira juventude, quando amara correr por entre as árvores, vagabundear nos telhados, miando à lua cheia canções de amor, certamente picarescas e debochadas. Ninguém podia imaginá-lo entoando canções românticas, sentimentais.
Naquelas redondezas não existia criatura mais egoísta e solitária. Não mantinha relações de amizade com os vizinhos e quase nunca respondia aos raros cumprimentos que, por medo e não por gentileza, alguns passantes lhe dirigiam. Resmungava de mau humor e voltava a fechar os olhos como se lhe desagradasse todo o espetáculo em redor.
(...) Do Gato Malhado ninguém se aproximava. As flores fechavam-se se ele vinha em sua direção: dizem que certa vez derrubara, com uma patada, um tímido lírio branco pelo qual se haviam enamorado todas as rosas. Não apresentavam provas, mas quem punha em dúvida a ruindade gatarraz? Os pássaros ganhavam altura ao voar nas imediações do esconso onde ele dormia. Murmuravam inclusive ter sido o Gato Malhado o malvado que roubara o pequeno sabiá do seu ninho de ramos. Mamãe Sabiá, ao não encontrar o filho para o qual trazia alimento, suicidou-se enfiando o peito no espinho de um mandacaru. Um enterro triste e naquele dia muitas pragas foram pronunciadas em intenção do Gato Malhado. Provas não existiam, mas que outro teria sido? Bastava olhar a cara do bichano para localizar o assassino. Bicho feio aquele.
(...) As maternais galinhas ensinavam aos pintos cor de ouro como evitar o Gato Malhado em cujas mãos criminosas — segundo afirmavam — muitos outros pintainhos haviam perecido (isso sem falar nos ovos que ele roubava dos ninhos para alimentar seu ignóbil corpanzil). Tampouco o Pato Negro queria saber dele, pois o gatarrão não amava a água do lago, tão querida do casal de patos. Os cachorros o haviam procurado para com ele correr e saltar. Mas ele os arranhara nos focinhos e os insultara, eriçando o pêlo, xingando-lhes a família, a raça, os ascendentes próximos e distantes.
Jorge Amado
1ª - O Gato Malhado demonstra o seu poder e domínio em relação aos mais fracos. Em nossa sociedade (seres humanos), é comum encontrarmos alguém ou uma classe social dominando, explorando a outra? Justifique sua resposta.
2ª - Identifique características psicológicas do Gato Malhado.
3ª – O título do texto “Gato Malhado” possui adjetivo? Qual?
4ª – Grife os adjetivos dos dois primeiros parágrafos do texto.
5ª – “Naquelas redondezas não existia criatura mais egoísta e solitária.”, os adjetivos egoísta e solitária faz referência a que substantivo?
6ª – No enunciado “dizem que certa vez derrubara, com uma patada, um tímido lírio branco pelo qual se haviam enamorado todas as rosas”, diga qual o sentido de se usar o artigo “um” e o artigo “as”.
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