segunda-feira, 6 de abril de 2015





"Da timidez" - Luis F. Veríssimo

Da Timidez
Ser um tímido notório é uma contradição. O tímido tem horror a ser notado, quanto mais a ser notório. Se ficou notório por ser tímido, então tem que se explicar.
Afinal, que retumbante timidez é essa, que atrai tanta atenção? Se ficou notório apesar de ser tímido, talvez estivesse se enganando junto com os outros e sua timidez seja apenas um estratagema para ser notado. Tão secreto que nem ele sabe. É como no paradoxo psicanalítico: só alguém que se acha muito superior procura o analista para tratar um complexo de inferioridade, porque só ele acha que se sentir inferior é doença.
Todo mundo é tímido, os que parecem mais tímidos são apenas os mais salientes. Defendo a tese de que ninguém é mais tímido do que o extrovertido. O extrovertido faz questão de chamar atenção para sua extroversão, assim ninguém descobre sua timidez. Já no notoriamente tímido a timidez que usa para disfarçar sua extroversão tem o tamanho de um carro alegórico. Daqueles que sempre quebram na concentração. Segundo minha tese, dentro de cada Elke Maravilha existe um tímido tentando se esconder e
dentro de cada tímido existe um exibido gritando "Não me olhem! Não me olhem!", só para chamar a atenção.
O tímido nunca tem a menor dúvida de que, quando entra numa sala, todas as atenções se voltam para ele e para sua timidez espetacular. Se cochicham, é sobre ele.
Se riem, é dele. Mentalmente, o tímido nunca entra num lugar. Explode no lugar, mesmo que chegue com a maciez estudada de uma noviça. Para o tímido, não apenas todo mundo mas o próprio destino não pensa em outra coisa a não ser nele e no que pode fazer para embaraçá-lo.
O tímido vive acossado pela catástrofe possível. Vai tropeçar e cair e levar junto a anfitriã. Vai ser acusado do que não fez, vai descobrir que estava com a braguilha aberta o tempo todo. E tem certeza de que cedo ou tarde vai acontecer o que o tímido mais teme, o que tira o seu sono e apavora os seus dias: alguém vai lhe passar a palavra.
O tímido tenta se convencer de que só tem problemas com multidões, mas isto não é vantagem. Para o tímido, duas pessoas são uma multidão. Quando não consegue escapar e se vê diante de uma platéia, o tímido não pensa nos membros da platéia como indivíduos. Multiplica-os por quatro, pois cada indivíduo tem dois olhos e dois ouvidos.
Quatro vias, portanto, para receber suas gafes. Não adianta pedir para a platéia fechar os olhos, ou tapar um olho e um ouvido para cortar o desconforto do tímido pela metade. Nada adianta. O tímido, em suma, é uma pessoa convencida de que é o centro do Universo, e que seu vexame ainda será lembrado quando as estrelas virarem pó. (Luis F. Veríssimo)

1) Que tese o autor defende?

2) Que sentido podemos depreender da frase: “o tímido nunca entra num lugar. Explode no lugar”?

3) Retire do texto um trecho que revela que o tímido é exagerado.

4) Em “Já no notoriamente tímido a timidez que usa para disfarçar sua extroversão tem o tamanho de um carro alegórico” a palavra “já” é usada como elemento coesivo e traz a ideia de:
(   ) condição     (   ) tempo     (   ) conformidade     (   ) contradição

5) Reescreva este trecho “O extrovertido faz questão de chamar atenção”, substituindo a palavra em destaque por “palhaço e o comediante”. Faça as adaptações necessárias.

6) Usando seus conhecimentos sobre as orações subordinadas adverbiais conformativa, consecutiva, final, proporcional, condição e temporal, classifique as orações em destaque:
a) “Quando não consegue escapar” ________________________________
b) “sua timidez seja apenas um estratagema para ser notado” ___________________________
c) “Segundo minha tese” _____________________ d) “Se riem, é dele” ____________________

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