07.TEXTO: MEU PROFESSOR INESQUECÍVEL
Mesmo antes de saber ler eu já
vivia num mundo de histórias, que meu pai, um gráfico, me contava. A
realidade para mim resumia-se em escovar os dentes e amarrar os sapatos.
O resto, fantasia das mil e uma noites e de mil historietas infantis.
Algumas, ele próprio inventava, mas não era seu forte. Geralmente fazia a
maior confusão, improvisando finais que nenhuma relação tinham com o
princípio. Sua memória nunca foi grande coisa. [...] Tendo terminado seu
trabalho, íamos para o fundo do quintal. Toda casa tinha um, comprido e
arborizado. [...]
Íamos felizes para o extremo da casa e sentávamos sobre caixotes. Eu adorava suas histórias [...].
- Como acaba a história, pai?
- Qual?- A que está contando.
- Refere-se à Branca de Neve?
- Essa o senhor já contou, mas pode contar outra vez.
- Bem, o Lobo Mau andava pela floresta de olho na Branca de Neve. Seguia a menina por toda parte, o malvado.
Estranhei.
- Não foi esse lobo que comeu a avozinha de Chapeuzinho Vermelho?
Meu pai hesitou. Era ou não era? Eu exigia.
- Primo dele.
- A inimiga da Branca de Neve não era a bruxa?
[...]
- E quem diz que não? Diabo de bruxa.
- O que o lobo faz nessa história?
- Pergunta oportuna. Ele passava pela floresta, como se não quisesse nada, quando viu a menina com os cinco anões.
- Sete anões, pai.
- No momento eram cinco. Dois estavam em casa com gripe. Tinham tomado muito sorvete. E cuidado você também com os gelados. Mas o lobo se deu mal porque o Pequeno Polegar, usando um estilingue, deu cabo dele. Dias depois a Branca de Neve e o Pequeno Polegar casavam-se.
- Ela não casou com um príncipe, pai? [...]
- Um príncipe?
- Sim, foi com um príncipe.
- Em segundas núpcias – esclareceu. – Coisas da vida.
Algum tempo depois, com o auxílio de uma cartilha, ele me ensinou a
ler, tarefa então mais complicada porque cavalo era assim- cavallo.
Farmácia era assim – pharmacia. Ontem era hontem. E a cidade de Niterói
escrevia-se Nictheroy.
Dentro de casa, porém, não me sentia ainda alfabetizado. O prazer
da leitura eu descobriria, também com ele, nos anúncios expostos no
interior dos bondes, os reclames, como então dizíamos. Notadamente no
camarão, o bonde fechado, apelido derivado de sua cor vermelha.
Silabando, eu lia os anúncios um a um. Na maioria remédios. Capivarol,
Biotônico Fontoura, Xarope São João. Eu e todo mundo porque a própria
propaganda, uma novidade, chamava a atenção geral. Os bondes era uma
cartilha animada para os meninos daquela geração.
[...] Foi ele quem ergueu o dedo, apontando-me o Martinelli, ainda
em andaimes. Levou-me para conhecer o Viaduto do Chá e presenciar a
abertura da Nove de Julho. Outra de suas paixões citadinas eram os
bairros ricos. Aos domingos, pela manhã, costumava passear à sombra das
mansões dos barões do café, em Higienópolis. Quando via uma delas
desocupada, dava um jeito de visitá-la. Lembro-me de nós percorrendo uma
infinidade de cômodos vazios de um verdadeiro palácio. Ele punha os
olhos em tudo, observando os detalhes da construção. Amava lustres,
escadas de mármore e ladrilhos portugueses. Nos banheiros exultava se as
torneiras fossem douradas. Homem exigente. Requintado, sim.
Marcos Rey
Nesta narrativa, o narrador apresenta o pai como seu primeiro e inesquecível professor.
1) Porque os fatos narrados foram marcantes para o narrador?
a) Porque foram momento de aprendizagem.
b) Porque o pai contava histórias inventadas.
c) Porque ele se divertia com as falhas de memória do pai.
d) Porque ele se encantava com as histórias de mil e uma noite.
2) Como eram transmitidos os ensinamentos do pai para o filho:
a) Por meio de histórias de vida.
b) Por meio de livros de literatura infantil.
c) Nos passeios pela cidade.
d) Por meio da narracão.
3) Como o narrador descobriu o prazer da leitura?
a) Nos livros de história.
b) Nos anúncios expostos no bonde.
c) Na cartilha.
d) Nas histórias que o pai escrevia.
4) O que o narrador quer dizer com "os bondes eram uma cartilha animada para os meninos"?
a) Que os passeios de bonde eram animados e divertidos.
b) Que passeando de bonde os meninos iam aprendendo a ler com os cartazes de rua.
c) Que nos bondes a propaganda chamava atencão e funcionava como uma cartilha , porque os meninos se esforcam para ler os anúncios.
d) Que os anúncios expostos no bonde eram divertidos.
08. TEXTO: ACABOU O VESTIBULAR
Cresce o número de escolas que selecionam calouros com métodos alternativos.
Quase 3 milhões de formandos no Ensino Médio estão neste
momento se preparando para disputar os exames vestibulares. Pelo menos
um terço desses adolescentes está matriculado em cursinhos para
compensar as falhas de sua formação do ensino fundamental. Às voltas com
apostilas e pilhas de exercícios, dormem mal e enfrentam um stress
violento. Pois bem. Esse inferno juvenil já tem remissão. “Acabou o
vestibular.” É com essa notícia para lá de boa que a Faculdade da
Cidade, uma universidade privada carioca, abre o seu site na Internet.
Em São Paulo, as Faculdades Metropolitanas Unidas seguem um caminho
parecido e mesmo escolas públicas, como a Universidade Federal de Santa
Maria e a Universidade de Brasília, UnB, já oferecem vagas segundo
critérios que passam ao largo da crueldade do vestibular tradicional.
O Ministério da Educação não tem a menor ideia de quantas
escolas estão usando métodos novos de seleção de calouros. Também não
quer saber, já que a Lei de Diretrizes e Bases aprovada em 1996
conferiu às universidades autonomia para definir como bem entenderem os
critérios de admissão aos seus cursos.
Cursinho e decoreba – O que assusta é que muitas faculdades de baixo
nível aboliram o vestibular como um recurso a mais para atrair
estudantes sem nenhuma condição de frequentar um curso superior, num
esquema “pagou-entrou”. Seria uma forma de tentar cooptar clientes num
momento em que 818 escolas particulares em todo o país disputam um
mercado que parou de crescer já há alguns anos, fixando-se na casa dos 2
milhões de alunos. Antes, com a exigência de que todas as faculdades
fizessem exames vestibulares, tinha-se a impressão de que havia algum
crivo, por mínimo que fosse, para a entrada no Ensino Superior. Mas era
só uma impressão, porque, na verdade, quem acabava entrando nessas
arapucas era gente que não conseguia ser aprovada em nenhuma seleção
séria. Não é aí que as coisas mudarão.
O que o fim do vestibular tem de bom é que acabará com o
horror e a desumanidade de submeter os jovens a um exame estúpido, que
exige o domínio artificialíssimo sobre todo o conteúdo do Ensino Médio.
Na prática, o que se faz é estimular a indústria dos cursinhos e a
decoreba de equações e fórmulas. As respeitadíssimas universidades
americanas da Califórnia, Harvard, Yale, ou o Instituto de Tecnologia de
Massachusetts, que não têm vestibular, já mostraram o caminho. Seus
alunos estão entre os melhores do mundo e são selecionados com base em
entrevistas e avaliações de desempenho escolar no decorrer de todo
Ensino Médio.
A Universidade Federal de Santa Maria, do Rio Grande do Sul, e a
UnB resolveram experimentar alternativas ao vestibular tradicional há
dois anos. Tem sido um sucesso. Em vez de bateria única de testes no
final do Ensino Médio, as duas universidades aplicam as provas em doses
homeopáticas, ao final de cada ano letivo. Terminando a 1ª Série, os
colégios inscrevem seus alunos para testes a respeito do currículo desse
ano. Findos a 2ª e 3ª séries, o mesmo procedimento se repete. Somadas
as notas obtidas ao longo dos três anos, os alunos são classificados.
Entram na faculdade os primeiros colocados. Na Federal de Santa Maria,
20% das vagas são preenchidas segundo esse critério. Na UnB, a avaliação
no decorrer do Ensino Médio responde pelo ingresso de 25% dos alunos.
Esse método permite que o estudante avalie o ensino que está
recebendo durante o Ensino Médio. “O programa tem um importante papel
educacional, porque o aluno do ensino médio acaba cobrando mais do
professor”, diz Ricardo Gauche, coordenador do Programa de Interação com
o Ensino Médio da Universidade de Brasília [...]
Com reportagem de Rodrigo Cardoso, de São Paulo, e Cristiane Prestes, de Porto Alegre.
O ESTUDO DO TEXTO
1.O texto lido, discute o exame vestibular no Brasil. No 1º parágrafo do texto encontra-se o lead, que responde às perguntas básicas de uma notícia: 0 quê, quem, quando, onde, como, por quê.
a) Qual é o fato?
O fim do vestibular em algumas universidades.
b) Onde esse fato tem ocorrido?
Faculdade da Cidade/RJ e Faculdades Metropolitanas Unidas/SP(particulares), já nas públicas são: Universidade de Santa Maria e a Universidade de Brasília- UnB.
c) Como isso tem sido feito?
Cada universidade tem autonomia para definir os critérios de admissão, segundo a Lei de Diretrizes e Bases.
d) Por que esse fato tem ocorrido?
Porque dos quase 3 milhões de formandos no Ensino Médio, um terço desses adolescentes fazem cursinho para compensar falhas do ensino fundamental.
2. Os demais parágrafos do texto ampliam o lead, acrescentando novos fatos, questionando suas causas e efeitos e interpretando-os. Em relação ao 1º e 2º parágrafos da parte do texto intitulada “Cursinho e decoreba”, responda:
a) Qual é a razão de faculdades particulares de baixo nível abolirem o vestibular?
Como um recurso para atrair mais estudantes.
b) Quais as consequências positivas decorrentes do fim do vestibular tradicional?
Que acabará com o horror e a desumanidade de submeter os jovens a um exame estúpido, que exige o domínio artificialíssimo sobre todo o conteúdo do Ensino Médio.
3) Universidade Federal de Santa Maria, do Rio Grande do Sul, e a UnB(Universidade de Brasília) adotaram método alternativo ao vestibular tradicional. Outras universidade já iniciaram processos de seleção baseados no mesmo método.
a) Em que consiste esse método alternativo?
As duas universidades aplicam as provas em doses homeopáticas, ao final de cada ano letivo. Terminando a 1ª série, os colégios inscrevem seus alunos para testes a respeito do currículo desse ano. Findos o 2ª e o 3ª séries, o mesmo procedimento se repete. Somadas as notas obtidas ao longo dos três anos, os alunos são classificados. Entram na faculdade os primeiros colocados.
4) Identifique e copie, no texto, um trecho de entrevista que destaca a contribuição desse novo método de seleção para o ensino médio.
"O programa tem um importante papel educacional, porque o aluno do ensino médio acaba cobrando mais do professor."
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09 . TEXTO: DECLARAÇÃO DE AMOR
Visto a camisa do Ano
Internacional do Voluntariado, promovido pela ONU, e faço do meu tempo
livre laço e abraço que nos une aos desfavorecidos. Espelho-me em meu
próximo. Faço de sua dor o meu ardor, de seu sofrer o meu dever, de seu
desamparo o ponto em que paro, ouço e destrilho-me do comodismo para ir
ao seu encontro.
Abro as janelas do espírito e espano a poeira da dessolidariedade.
Arranco os olhos da TV, o traseiro do sofá, a indolência da ociosidade e
recolho a língua de inconfidentes mesquinharias. Vou até lá, onde a
carência é expectativa de mão amiga: a creche da periferia, o hospital
de indigentes, o asilo de memórias esquecidas, as instituições do
terceiro setor comprometidas com o pão de cada dia da verdadeira
democracia: a cidadania.
Não faço o trabalho do poder público, nem o isento da obrigação
de resgatar, o quanto antes, a dívida social. Não me disponho a ser mão
de obra gratuita de entidades que sonegam o direito ao trabalho com o
recibo adulterado da boa vontade alheia.
Ser voluntário é somar esforços, entrar pela porta da compaixão e
repartir o que nenhum mercado oferece ou provê: carinho, apoio,
talento, cumplicidade, de modo a dar a vez a quem foi emudecido pela
opressão, e voz a quem foi excluído pela injustiça.
O voluntariado resgata a minha autoestima, redesenha minha face
humana, desdobra as fibras endurecidas de minha abissal preguiça,
insere-me na dinâmica social, faz-me próximo dessas multidões premiadas
injustamente pela loteria biológica por nascerem empobrecidas. Eu
poderia ser um deles. Meu bem-estar, mais que privilégio, é (b)ônus.
Sou voluntário porque sou solidário, presente no universo das
aflições, na esfera alucinada dos dependentes químicos, na saudável
reinvenção do esporte junto àqueles que estão próximos a ser derrotados
pelo jogo do crime.
Mobilizo coletas de alimentos para quem sabe que “a fome é ontem”,
como exclamou Gabriela Mistral, e trabalho em favor da conquista de
direitos, para quem padece desmandos estruturais e políticos.
Apoio empresas cientes de sua responsabilidade social. Busco
torná-las elos da vasta corrente ética que já não faz da obsessão do
lucro sua única razão de ser, pois centram o ser humano em seus
empreendimentos ecológicos, liberam funcionários para atividades
voluntárias, sem reduzir-lhes salários ou cobrar-lhes reposição de
horas. São empresas prestadoras do único serviço que não tem preço: o
gesto samaritano.
Não faço “caridade”, nem dou esmolas. Longe de mim o
assistencialismo que aplaca os descasos políticos como quem aplica
pomadas.
Voluntário, sou multidão. Solidário, sou mutirão. Somando com todos aqueles que têm fome e sede de justiça.
Inebriado pela utopia bíblica do paraíso, recuso-me a acatar
qualquer uma das fraturas que negam à família humana o direito à
fraternura. Dou as mãos a quem acredita que a felicidade é o artigo
único da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Frei Betto. O Estado de S. Paulo, 15/10/1997.
1. O texto tem como título Declaração de amor. Sabendo que declarar significa dar a conhecer, manifestar, anunciar, comunicar, responda.
a) O que o autor dá a conhecer ou anuncia nesse texto?
Como ser voluntário.
2. O autor assume de modo consistente a sua posição de comprometimento com os menos favorecidos. Assinale a alternativa que confirme a posição do autor.
a) ( x ) “Visto a camisa do Ano Internacional do Voluntariado, promovido pela ONU, e faço do meu tempo livre laço e abraço que nos une aos desfavorecidos.”
b) ( ) “Arranco os olhos da TV, o traseiro do sofá, a indolência da ociosidade e recolho a língua de inconfidentes mesquinharias.”
c) ( ) “Apoio empresas cientes de sua responsabilidade social”.
3.A posição do autor vai se revelando pela explicitação do que significa “vestir a camisa”. Releia os dois primeiros parágrafos e explique o que significa essa ideia, segundo o autor.
Segundo o autor, "vestir a camisa " é comprometimento com o voluntariado, e não fazer o trabalho do poder público ou ser mão de obra gratuita de entidades que sonegam o direito ao trabalho com o recibo adulterado da boa vontade alheia.
4.O autor apresenta aos leitores sua escala de valores pessoais, ao expressar os motivos que o fazem engajar-se no movimento voluntário.
a) Quais são esses motivos?
Unir aos desfavorecidos, somar esforços, dar carinho, apoio, cumplicidade, de modo a dar a vez a quem foi emudecido pela opressão, e voz a quem foi excluído pela injustiça.
b) Além do que o voluntariado pode proporcionar aos menos favorecidos, na sua opinião, que outros ganhos pessoais poderiam ser acrescentados?
Resposta pessoal.
5. De acordo com o autor, ser voluntário é ser solidário e participar ativamente com ações concretas.
a) Entre as diversas ações que realiza, o autor cita o apoio a determinadas empresas. Em que essas empresas se destacam?
Empresas ciente se sua responsabilidade social, prestadoras de um único serviço que não tem preço: o gesto samaritano.
b) Na sua opinião, qual estratégia desperta mais o interesse das pessoas pelo voluntariado: abordar as consequências da falta de ação solidária ou citar exemplos de ações bem-sucedidas?
Resposta pessoal.
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