terça-feira, 22 de agosto de 2017

A imagem pode conter: flor e planta22.Os sonhos dos adolescentes


Se tivesse que comparar os jovens de hoje com os de dez ou vinte anos atrás, resumiria assim: eles sonham pequeno. É curioso, pois, pelo exemplo de pais, parentes e vizinhos, nossos jovens sabem que sua origem não fecha seu destino: sua vida não tem que acontecer necessariamente no lugar onde nasceram, sua profissão não tem que ser a continuação da de seus pais. Pelo acesso a uma proliferação extraordinária de ficções e informações, eles conhecem uma pluralidade inédita de vidas possíveis.
Apesar disso, em regra, os adolescentes e os pré-adolescentes de hoje têm devaneios sobre seu futuro muito parecidos com a vida da gente: eles sonham com um dia-a-dia que, para nós, adultos, não é sonho algum, mas o resultado (mais ou menos resignado) de compromissos e frustrações. Eles são "razoáveis": seu sonho é um ajuste entre suas aspirações heroico-ecológicas e as "necessidades" concretas (segurança do emprego, plano de saúde e aposentadoria). Alguém dirá: melhor lidar com adolescentes tranquilos do que com rebeldes sem causa, não é? Pode ser, mas, seja qual for a qualidade dos professores, a escola desperta interesse quando carrega consigo uma promessa de futuro: estudem para ter uma vida mais próxima de seus sonhos. É bom que a escola não responda apenas à "dura realidade" do mercado de
trabalho, mas também (talvez, sobretudo) aos devaneios de seus estudantes; sem isso, qual seria sua promessa? "Estude para se conformar"? Consequência: a escola é sempre desinteressante para quem pára de sonhar.
É possível que, por sua própria presença maciça em nossas telas, as ficções tenham perdido sua função essencial e sejam contempladas não como um repertório arrebatador de vidas possíveis, mas como um caleidoscópio para alegrar os olhos, um simples entretenimento. Os heróis percorrem o mundo matando dragões, defendendo causas e encontrando amores solares, mas eles não nos inspiram: eles nos divertem, enquanto, comportadamente, aspiramos a um churrasco no domingo e a uma cerveja com os amigos. É também possível (sem contradizer a hipótese anterior) que os adultos não saibam mais sonhar muito além de seu nariz. Ora, a capacidade de os adolescentes inventarem seu futuro depende dos sonhos aos quais nós renunciamos.
Pode ser que, quando eles procuram, nas entrelinhas de nossas falas, as aspirações das quais desistimos, eles se deparem apenas com versões melhoradas da mesma vida acomodada que, mal ou bem, conseguimos arrumar. Cada época tem os adolescentes que merece.

INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS E EXERCÍCIOS

1. O autor considera que falta aos jovens de hoje:

(A) um mínimo de discernimento entre o que é real e o
que é puro devaneio.
(B) uma confiança maior nas promessas de futuro
acenadas pelo mercado de trabalho.
(C) a inspiração para viver que lhes oferecem os que
descartaram as idealizações.
(D) a aspiração de perseguir a realização dos sonhos
pessoais mais arrojados.
(E) a disposição de se tornarem capazes de usufruir a
estabilidade profissional.

2. Atente para as seguintes afirmações:

I. As múltiplas ficções e informações que circulam no
mundo de hoje impedem que os jovens formulem
seus projetos levando em conta um parâmetro mais
realista.
II. As escolas deveriam ser mais consequentes diante
da dura realidade do mercado de trabalho e
estimular os jovens a serem mais razoáveis em
seus sonhos.
III. As ficções que proliferam em nossas telas são
assimiladas como divertimento inconsequente, e
não como sinalização inspiradora de uma pluralidade
de vidas possíveis.
Em relação ao texto, está correto o que se afirma em:

(A) I, II e III.
(B) I e II, apenas.
(C) III, apenas.
(D) II, apenas.
(E) I, apenas.

3. No segundo parágrafo, ao estabelecer uma relação entre
os jovens e os adultos de hoje, o autor faz ver que:

(A) os sonhos continuam sendo os mesmos, para uns e
para outros.
(B) os adultos, quando jovens, eram mais conservadores
que os jovens de hoje.
(C) os jovens esperam muito mais do que os adultos já
obtiveram.
(D) o patamar de realização de vida atingido pelos
adultos tornou-se uma meta para os jovens.
(E) a resignação dos adultos constitui a razão de frustração
dos jovens.

 4. A expressão hipótese anterior, que surge entre parênteses,
faz referência à seguinte passagem do texto:

(A) É possível que (...) as ficções tenham perdido sua
função essencial.
(B) Consequência: a escola é sempre desinteressante
para quem pára de sonhar.
(C) Pode ser que (...) eles se deparem apenas com
versões melhoradas da mesma vida (...)
(D) Ora, a capacidade de os adolescentes inventarem
seu futuro depende dos sonhos aos quais nós
renunciamos.
(E) (...) seja qual for a qualidade dos professores, a
escola desperta interesse quando carrega consigo
uma promessa de futuro (...).

5. Certa impropriedade que se verifica no uso da expressão
nas entrelinhas das nossas falas poderia ser evitada, sem
prejuízo para o sentido pretendido, caso o autor a tivesse
substituído por:

(A) entre os parênteses das nossas conversas.
(B) no que não se explicita em nossas palavras.
(C) nas assumidas reticências do nosso estilo.
(D) na falta de ênfase de nossas declarações.
(E) no que não se sublinha em nossos discursos.

23.     COMO  O  REI  DE  UM  PAÍS  CHUVOSO

Um espectro(aparição ilusória) ronda o mundo atual: o espectro do tédio. Ele se manifesta de diversas maneiras. Algumas de suas vítimas invadem o “shopping center” e, empunhando um cartão de crédito, comprometem o futuro do marido ou da mulher e dos filhos. A maioria opta por ficar horas diante da TV, assistindo a “reality shows”, os quais, por razões que me escapam, tornam interessante para seu público a vida comum de estranhos, ou seja, algo idêntico à própria rotina considerada vazia, claustrofóbica.
O mal ataca hoje em dia faixas etárias que, uma ou duas gerações atrás, julgávamos naturalmente imunizadas a seu contágio. Crianças sempre foram capazes de se divertir umas com as outras ou até sozinhas. Dotadas de cérebros que, como esponjas, tudo absorvem e de um ambiente, qualquer um, no qual tudo é novo, tudo é infinito, nunca lhes faltam informação e dados a processar. Elas não precisam ser entretidas pelos adultos, pois o que quer que estes façam ou deixem de fazer lhes desperta, por definição, a curiosidade natural e aguça seus instintos analíticos. E, todavia, os pais se veem cada vez mais compelidos a inventar maneiras de distrair seus filhos durante as horas ociosas destes, um conceito que, na minha infância, não existia. É a ideia de que, se a família os ocupar com atividades, os filhos terão mais facilidades na vida.
Sendo assim, os pais, simplesmente, não deixam os filhos pararem. Se o mal em si nada tem de original e, ao que tudo indica, surgiu, assim como o medo, o nojo e a raiva, junto com nossa espécie ou, quem sabe, antes, também é verdade que, por milênios, somente uma minoria dispunha das precondições necessárias para sofrer dele. Falamos do homem cujas refeições da semana dependiam do que conseguiria caçar na segunda-feira, antes de, na terça, estar fraco o bastante para se converter em caça e de uma mulher que, de sol a sol, trabalhava com a enxada ou o pilão. Nenhum deles tinha tempo de sentir o tédio, que pressupõe ócio abundante e sistemático para se manifestar em grande escala. Ninguém lhe oferecia facilidades. Por isso é que, até onde a memória coletiva alcança, o problema quase sempre se restringia ao topo da pirâmide social, a reis, nobres, magnatas, aos membros privilegiados de sociedades que, organizadas e avançadas, transformavam a faina abusiva da maioria no luxo de pouquíssimos eleitos.
O tédio, portanto, foi um produto de luxo, e isso até tão recentemente que Baudelaire, para, há século e meio, descrevê-lo, comparou-se ao rei de um país chuvoso, como se experimentar delicadeza tão refinada elevasse socialmente quem não passava de “aristocrata de espírito”.
Coube à Revolução Industrial a produção em massa daquilo que, previamente, eram raridades reservadas a uma elite mínima. E, se houve um produto que se difundiu com sucesso notável pelos mais inesperados andares e cantos do edifício social, esse produto foi o tédio. Nem se requer uma fartura de Primeiro Mundo para se chegar à sua massificação. Basta, a rigor, que à satisfação do biologicamente básico se associe o cerceamento de outras possibilidades (como, inclusive, a da fuga ou da emigração), para que o tempo ocioso ou inútil se encarregue do resto. Foi assim que, após as emoções fornecidas por Stalin e Hitler, os países socialistas se revelaram exímios fabricantes de tédio, único bem em cuja produção competiram à altura com seus rivais capitalistas. O tédio não é piada, nem um problema menor. Ele é central. Se não existisse o tédio, não haveria, por exemplo, tantas empresas de entretenimento e tantas fortunas decorrentes delas. Seja como for, nem esta, nem soluções tradicionais (a alta cultura, a religião organizada) resolverão seus impasses. Que fazer com essa novidade histórica, as massas de crianças e jovens perpetuamente desempregados, funcionários, gente aposentada e cidadãos em geral ameaçados não pela fome, guerra ou epidemias, mas pelo tédio, algo que ainda ontem afetava apenas alguns monarcas?
ASCHER, Nélson, Folha de S. Paulo, 9 abr. 2007, Ilustrada. (Texto adaptado)

INTERPRETAÇÃO DE TEXTO

1)  O título do texto contém, sobretudo,

A) uma alusão à antítese entre a facilidade de provimento das necessidades materiais
e o vazio decorrente do ócio e da monotonia pela ausência de motivos por que
lutar.
B) uma comparação que trata da dificuldade de convivência entre a opulência do
poder e a manipulação decorrente do consumismo exacerbado.
C) uma metáfora relacionada à coabitação da angústia existencial contemporânea
com a busca de sentidos para a vida, especialmente entre os membros da
aristocracia.
D) uma referência ao conflito advindo da solidão do poder, especialmente no que se
refere ao desânimo oriundo da ausência de perspectivas para a vida em sociedade.

2) O texto NÃO menciona como causa para a presença do tédio na sociedade moderna

A) a ausência de atividades físicas compulsórias relacionadas com a sobrevivência.
B) a facilidade de acesso aos bens que proveem as necessidades físicas primárias.
C) a limitação da mobilidade física e privação de certas liberdades.
D) a proliferação de empresas e de espaços de lazer e de consumo.

3) A alternativa em que o termo destacado NÃO está corretamente explicado entre
parênteses é:

A) “[...] aos membros privilegiados de sociedades que [...] transformavam a faina(trabalho prolongado)abusiva da maioria no luxo de pouquíssimos eleitos.”  (A CARÊNCIA,
A MISÉRIA)
B) “Basta [...] que à satisfação do biologicamente básico se associe o cerceamento
de outras possibilidades [...]”  (A RESTRIÇÃO, A SUPRESSÃO)
C) “[...] os países socialistas se revelaram exímios fabricantes do tédio[...]”
 (EMINENTES, PERFEITOS)
D) “Um espectro ronda o mundo atual: o espectro do tédio.” (UM
FANTASMA, UMA AMEAÇA)

4) “O mal ataca hoje em dia faixas etárias que, uma ou duas gerações atrás, julgávamos
naturalmente imunizadas a seu contágio.” (linhas 8-9)
A expressão destacada pode ser substituída sem alteração significativa do sentido por:

A) a uma ou duas gerações.
B) acerca de duas gerações.
C) há uma ou duas gerações.
D) por uma ou duas gerações.

5) “Se não existisse o tédio, não haveria, por exemplo, tantas empresas de
entretenimento e tantas fortunas decorrentes delas.”
Alterando-se os tempos verbais, haverá erro de coesão em:

A) Não existindo o tédio, não haveria, por exemplo, tantas empresas de
entretenimento e tantas fortunas decorrentes delas.
B) Se não existe o tédio, não terá havido, por exemplo, tantas empresas de
entretenimento e tantas fortunas decorrentes delas.
C) Se não existir o tédio, não vai haver, por exemplo, tantas empresas de
entretenimento e tantas fortunas decorrentes delas.
D) Se não tivesse existido o tédio, não teria havido, por exemplo, tantas empresas de
entretenimento e tantas fortunas decorrentes delas.


6) A supressão da vírgula implica alteração do sentido em:

A) “Coube à Revolução Industrial a produção em massa daquilo que, previamente,
eram raridades reservadas a uma elite mínima.”
Coube à Revolução Industrial a produção em massa daquilo que previamente eram
raridades reservadas a uma elite mínima.
B) “Nenhum deles tinha tempo de sentir o tédio, que pressupõe ócio abundante e
sistemático [...]”
Nenhum deles tinha tempo de sentir o tédio que pressupõe ócio abundante e
sistemático [...]
C) “O tédio não é piada, nem um problema menor.”
O tédio não é piada nem um problema menor.
D) “[...] também é verdade que, por milênios, somente uma minoria dispunha das
precondições necessárias [...]”
[...] também é verdade que por milênios somente uma minoria dispunha das
precondições necessárias [...]

GABARITO
Questão 01: B
Questão 02: D
Questão 03: A
Questão 04: C
Questão 05: CQuestão 06: A

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