quinta-feira, 1 de outubro de 2015


Os patos da Mariana

 
Patos ainda hoje há, mas a barraca da Mariana na Península de Tróia, essa já só faz parte das memórias de alguns Setubalenses, como é o meu caso, o que quer dizer que eu já colecciono um currículo de algumas décadas. Cada Tróia com sua lenda e aqui em vez de Helena havia a Mariana, proprietária de um barraco de madeira onde os banhistas que atravessavam o Sado para se deliciarem nas suas águas cristalinas, matavam a sede com umas cervejolas e uns caracolitos, pondo em dia a conversa e discutindo, já nessa época, a crise, que pelos vistos, cá por estas bandas, já é crónica.
A propósito dos patos, Kali andava por ali e tomou a seu cargo a ninhada que o perseguia como se de um pai se tratasse. Da mãe não reza a história. A sua dedicação a Mariana, a troco de um prato de comida e um canto para abrigar o esqueleto, media-se pela sua reverência pelo Vitória, clube do seu coração, que ele seguia para todo o lado, para aplaudir de perto Jacinto João, altura em que os patos ficavam para segundo plano e à mercê do acaso.
Com a taça de Portugal no coração, o seu Vitória não lhe poderia ter dado maior alegria e no júbilo de tanta emoção, mal o barco atracou em Tróia, foi acometido de uma forte dôr no seu coração, os patos haviam desaparecido e Kali, desolado sentia-se o único responsável por tamanha perda.
O desgosto consumia-o e sempre que um garoto jogava à bola nas imediações do barraco começava o suplício de kali:
- Qua, Qua, os patos da Mariana!
E Kali virou chacota da canalha, acabando por se ir embora para a cidade, mas longe da areia branca da praia o pesadelo continuava:
- Qua,Qua, os patos da Mariana!
Kali, entre pedras e um ripostar de adjectivos malfadados, cumpriu a sua pena até ao fim e esta não era de pato.

Nota: Deve ser por isto que um dos meus pratos favoritos é pato escondido...

 

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